Reeleito em 2024 com o maior percentual de votos válidos entre os prefeitos eleitos nas capitais dos 26 estados brasileiros, o atual prefeito de Macapá, Dr. Furlan (MDB), prefere os aplausos por shows e construção de praças, do que buscar soluções para os problemas enfrentados diariamente pela população, como: a falta de saneamento básico, abastecimento de água e tratamento de lixo.
Durante os quatro anos de seu primeiro mandato, a gestão municipal optou por priorizar o que muitos chamam de “governança de superfície”, aquela que se sustenta na aparência, mas não resolve os problemas reais da população. Entre os principais investimentos estiveram a urbanização de espaços públicos com praças e a realização de grandes eventos culturais e musicais com artistas de renome nacional. A estratégia, embora garanta visibilidade e aprovação popular, parece seguir a velha cartilha romana do “pão e circo”, enquanto as estruturas essenciais da cidade seguem em colapso.
A expressão “pão e circo”, oriunda da Roma Antiga (panem et circenses), define com precisão esse tipo de gestão: suprir as necessidades básicas de distração da população para encobrir ou minimizar a percepção das deficiências estruturais.
A aposta em grandes eventos, shows, festas e praças urbanizadas garante popularidade e engajamento imediato, mas não enfrenta os desafios estruturais de saneamento, saúde pública, educação e habitação, que exigem mais tempo, planejamento técnico e recursos.
📉 Saneamento: a vergonha nacional
De acordo com o Ranking do Saneamento 2024, divulgado pelo Instituto Trata Brasil, em parceria com a GO Associados Macapá figura entre as três piores capitais do país em indicadores de saneamento básico, ao lado de Porto Velho (RO) e Santarém (PA). A situação é alarmante:
- Segundo pior índice de saneamento básico entre todas as capitais;
- Apenas 8,05% da população tem acesso à coleta de esgoto;
- Do esgoto coletado, só 22,17% é efetivamente tratado;
- O restante segue sem qualquer tipo de destinação sanitária adequada, expondo a população a doenças e poluição ambiental.
Além disso, Macapá tem abastecimento total de água em apenas 54,38% das residências, um dos piores índices entre as capitais brasileiras — número muito abaixo da média nacional de 95,68%.
🗑️ Lixo e saúde pública
A precariedade se estende à coleta e ao tratamento de resíduos sólidos. Sem uma política estruturada de gestão de lixo urbano, a cidade enfrenta acúmulo de entulho em vias públicas e descarte irregular, o que intensifica a proliferação de vetores de doenças, como mosquitos, ratos e baratas. Em bairros periféricos, moradores relatam viver com lixo a céu aberto por semanas.
🚱 Os impactos na vida dos moradores
Mais de 90% da população de Macapá convive com esgoto a céu aberto, o que implica em graves riscos à saúde pública, proliferação de doenças e degradação ambiental.
A falta de saneamento básico, água tratada e coleta de lixo não é apenas um problema estatístico — é uma tragédia cotidiana para milhares de famílias. Em bairros mais vulneráveis, crianças adoecem por infecções gastrointestinais, idosos enfrentam dificuldades para manter higiene mínima e comunidades inteiras vivem cercadas por fossas nos quintais, valas de esgoto e lixo acumulado.
“Tem show na praça, mas a rua da minha casa é intrafegável ”, relata Dona Maria, moradora do bairro Marabaixo. “Quando chove, e lama pra todo lado. A gente fica com medo até de sair de casa.”
🎶 Festas em meio à lama
Enquanto isso, o município gasta milhões com festivais, eventos de música e grandes estruturas para shows em praças recém-inauguradas. A estratégia tem funcionado eleitoralmente, como demonstrou a expressiva votação em 2024. Mas os números revelam o custo oculto dessa escolha política: uma população privada de direitos básicos, especialmente os mais pobres.
Especialistas apontam que a ausência de saneamento está diretamente ligada ao aumento de internações por doenças evitáveis, à evasão escolar (por falta de higiene e saúde das crianças) e à estagnação econômica de áreas periféricas.
O caso de Macapá não é isolado. Ele representa uma falência do pacto federativo na garantia de condições mínimas de dignidade urbana, principalmente na região Norte. A permanência de gestões que priorizam o efêmero em detrimento do essencial é um alerta sobre como o voto ainda é guiado por percepções imediatistas e como a ausência de políticas estruturantes aprofunda desigualdades históricas.
🧭 Entre brilho e lama: para onde vai Macapá?
A reeleição do atual gestor mostra que o apelo midiático ainda é um instrumento poderoso, sobretudo em realidades onde falta acesso à informação crítica. Contudo, cresce a pressão por uma mudança de rumo que priorize investimentos estruturais, capazes de promover qualidade de vida real para a população.
Enquanto Macapá brilha nos palcos e nas selfies de shows lotados, milhões vivem sem esgoto, sem água tratada e sem dignidade.
A pergunta que fica é: até quando o entretenimento será usado para esconder a lama?