
Em 2015, a Secretaria de Educação do Amapá (Seed) assinou contrato com a Cooperativa Agroindustrial de Produção de Alimentos (Agrocoop), para comprar merenda escolar para a rede estadual de ensino. Os recursos foram repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Na época, a própria Controladoria-Geral do Estado encontrou indícios de irregularidades. Foi o início das investigações, que seguiram conduzidas pela Polícia Federal e Ministério Público, com o auxílio do TCU e CGU.
Em outubro de 2017, a PF deflagrou a operação Senhores da Fome, para desmobilizar o esquema que envolvia de um lado, os gestores da Seed, que faziam os pagamentos por meio de declarações forjadas de dirigentes escolares, e de outro, empresários que recebiam os pagamentos como se todo o material comprado tivesse sido entregue. De acordo com as investigações, cerca de 70% da merenda não chegavam às escolas.
Na denúncia feita à justiça, o Ministério Público Federal descreveu que o total desviado chegou a R$ 2,2 milhões. Valor que a Seed teria repassado à Agrocoop, sem que o serviço tivesse sido prestado na totalidade. E não era só na quantidade que o dinheiro era roubado, mas também na qualidade dos produtos entregues. De acordo com diálogos entre os investigados, adquiridos por meio de interceptações telefônicas, um dos gestores da Agrocoop, discute com seu filho métodos para adulterar as polpas de açaí, colocando água e conservantes, como forma de aumentar o rendimento e mascarar a baixa qualidade e quantidade dos produtos efetivamente entregues.
Segundo o MPF, os diretores das escolas eram coagidos pelos gestores da Seed, para que fornecessem declarações falsas de que tinham recebido a totalidade dos alimentos e assim, garantir que a Agrocoop recebesse os pagamentos.
Na decisão publicada no dia 18 de abril, o juiz federal substituto Athos Alexandre Câmara Attiê, garante que as provas que compõem a Ação Civil Pública por Improbidade Administrativa são claras e objetivas. Foram reunidas por meio de interceptações telefônicas com conversas entre os réus, notas fiscais, termos de recebimentos de mercadorias forjados, depoimentos de testemunhas que incriminam os investigados e relatórios da CGU e TCU.
A Condenação
Ao definir a pena que seria atribuída aos réus, o magistrado descreveu a responsabilidade de cada um no esquema.
Conceição Medeiros, Secretária de Educação do Amapá na época, teria sido alertada sobre as irregularidades, mesmo assim, teria atuado para agilizar os processos e autorizar os pagamentos de forma irregular à Agrocoop.
Albertina Guedes, que era Coordenadora Administrativa da Seed, teria feito a convocação e pressão das fiscais designadas do contrato para obter assinaturas em termos falsos de recebimento, viabilizando pagamentos sem qualquer fiscalização efetiva.
Cada uma delas foi condenada a devolver 20% do prejuízo causado à União, valor correspondente a R$ 410 mil, mais multa individual de R$ 1,2 milhão, além da perda da função pública eventualmente ocupada e suspensão dos direitos políticos por dez anos.
Débora Corrêa, Coordenadora Financeira da Secretaria, seria a responsável por processar e autorizar os pagamentos, mesmo ciente das irregularidades, validando termos fraudulentos sem qualquer comprovação. De acordo com a decisão, ela terá que devolver o equivalente a 5% do total desviado, cerca de R$ 102 mil, mais multa de R$ 307 mil. Além da perda da função pública eventualmente ocupada.
No núcleo empresarial do esquema, Gilcimar Pureza, seria o líder oculto da cooperativa. O juiz Athos Alexandre descreveu que ele se valia de terceiros para dar aparência de regularidade à entidade. De acordo com interceptações telefônicas, ele conversava com os diretores da Agrocoop para consultar sobre como proceder diante dos entraves contratuais e da pressão investigativa.
O juiz cita ainda que Gilcimar criou uma cooperativa de fechada, colocando pessoas sem qualificação técnica, e assim mantinha a liderança do esquema negociando diretamente com os gestores públicos.
Ele foi condenado a devolver o equivalente a 12,5% do total desviado, mais de R$ 256 mil, mais multa de R$ 769 mil. Além da suspensão dos direitos políticos pelo período máximo de 10 anos e a proibição de contratar com o Poder Público também pelo prazo de 10 anos.
Os gestores da Agrocoop também foram condenados. Daciel Cunha, Diretor Operacional, seria responsável pelas entregas fraudulentas e pela coleta dos comprovantes falsos junto às escolas estaduais. Edilson dos Reis, presidente da cooperativa, responsável pela formalização do contrato e requerimentos falsos para garantir os pagamentos, e Edilson da Rocha, que teria tido a função de adulterar os alimentos destinados às escolas.
Cada um deles, de acordo com a decisão, terá que devolver aos cofres públicos 12,5% do valor do prejuízo, o equivalente a R$ 256 mil, mais multa de R$ 769 mil. Além da suspensão dos direitos políticos pelo período de 9 anos, e a proibição de contratar com o Poder Público.
Um outro membro da cooperativa, Elivaldo da Silva, que teria tido proveito econômico mais limitado em relação aos demais réus, deverá ressarcir 5% do prejuízo total, pouco mais de R$ 102, e multa de R$ 307 mil.
Os gestores escolares, réus na ação, foram absolvidos. A decisão reconheceu que eles eram coagidos pelos gestores da Seed a assinar documentos fraudulentos comprovando o recebimento correto da mercadoria.